terça-feira, 30 de julho de 2013

Neuro-Visceral Exhumation "Mass Murder Festival"

Faz já um tempo que decidi escutar novamente toda a minha coleção de cds. Sabia que ouvir tudo ia demorar. Afinal, tenho quatro mil discos digitais. Mas não achei que depois de quinze anos só teria ouvido dois terços do total. Algumas vezes deparei com goiabas horríveis. Coisas pavorosas que, simplesmente, não consegui entender a razão de haver um dia comprado. O destino dessas tralhas invariavelmente é o sebo. Claro, sempre levo prejuízo nessas negociações. Mas, pelo menos, arrumo espaço para adicionar novos títulos às minhas já lotadas prateleiras. De outro lado, muitas vezes redescubro discos excelentes. Discos que, por alguma razão, acabaram injustamente esquecidos no meio de muitos outros. Esses dias tive a felicidade de redescobrir uma dessas pérolas: "Mass Murder Festival", o full lenght de estreia da finada banda paulista de splatter Neuro-Visceral Exhumation, lançado em 2003 pelo selo australiano No Escape.
O que temos neste paly é o mais puro splatter que se pode almejar. Nada de influência de death metal nem de power violence. Nada de Suffocation ou Cannibal Corpse tocado ao dobro da velocidade - o que muitos passaram confusamente a entender como "splatter" a partir do fim dos anos 90. Quando falo de splatter quero dizer splatter mesmo: letras discorrendo principalmente sobre mortes cruentas, patologias e anomalias médicas (e não obsessivamente sobre fetichismo sexual, machismo chauvinista ou misoginia), riffs mórbidos derivados do grindcore old school, vocais absurdos nos extremos da distorção, baixo em curto-circuito tributário da escola napalmiana, passagens crust/hardcore no contra-tempo, picos histéricos de grind (que não se confundem com os blast beats do death ou do black metal noventistas) e insidiosas cadências quebra-pescoço vindas do metal mais imundo. É nessa cartilha que reza o Neuro-Visceral Exhumation.
A principal referência da banda é o maravilhoso Dead Infection, da Polônia, da fase clássica do "A Chapter of Accidents", conjunto do qual, significativamente, os paulistas fazem aqui um cover. Assim como nesse brutal play do Dead Infection, as músicas do Neuro-Visceral Exhumation, em "Mass Murder Festival", são totalmente guiadas pela velocidade, com evidente destaque para as levadas quebradas e epiléticas do batera, que, a propósito, é o compositor principal da banda. Alguns momentos mais cadenciados aparecem aqui e ali, mas com muita parcimônia (para o meu gosto, com parcimônia até demais). De fato, quando esses momentos mais cadenciados surgem, o convite ao headbanging torna-se irresistível, como se pode conferir na intoxicante "Fatal Anal Sex Disembowelment". Ouçam e me respondam se essa cadência demolidora não parece muito com as coisas que o Mortician - a banda mais grind do death clássico americano - gosta de fazer.
A produção eficiente (para o estilo) conferiu à bateria aquela sonoridade "pipoca na panela" tão característica das bandas de splatter pós-Carcass. Vocais mastigados e decompostos na mais pútrida distorção, escudados por ótimos riffs executados por uma sessão de cordas extremamente pesada, completam o time vitorioso do Neuro-Visceral Exhumation neste play. A banda ainda gravou um segundo full lenght - "The Human Society Wants More Gore" - no ano seguinte (2004), mostrando alguma influência de death metal e uma produção menos impactante. Embora também seja um bom disco, não se compara ao seu debut. Aliás, seria salutar se algum selo se dispusesse a relançar os splits gravados pela banda anteriormente aos seus full lenghts. Esse material raro e hoje totalmente fora de catálogo merece ser resgatado.
Na minha opinião, "Mass Murder Festival" é o melhor disco de verdadeiro splatter já gravado no Brasil. Um pequeno clássico do estilo, que pode ser colocado em pé de igualdade (ou próximo disso) com obras de bandas internacionais reconhecidas pertencentes à segunda e terceira ondas do splatter, como as do francês Pulmonary Fibrosis, do holandês Last Days of Humanity ou do alemão Mucupurulent. Mais uma prova inequívoca da força do underground brasileiro em todos os estilos mais radicais do punk e do metal.


Fidelidade ao splatter até no logo


O pessoal do N.V.E. na gravação do "Mass Murder Festival"


PS. Leiam também a resenha desse mesmo cd feita pelo K.O.D.A. no blogue Som Extremo

Um comentário:

  1. "Suffocation ou Cannibal Corpse com o dobro da velocidade" - exatamente! É o que muitos pensam que seja Splatter. Se formos ver bem, são relativamente bem poucas as bandas que genuinamente adotam esse estilo. Você mencionou as mais importantes! Gabriel

    ResponderExcluir